De repente olhou em volta e cansou das luzinhas acesas nos prédios que via da janela. Amarrou uma fita vermelha na cabeça, ajeitou a camisola e sentou no parapeito, sem medo de olhar pra baixo. Tudo aquilo lá era importante: os arbustos, as pedras, a amarelinha desenhada no chão, o próprio chão, as famílias felizes nos seus lares... E o pouco que levava cá, dentro do peito e da cabeça, não tinha significado algum. Tantos amores vazios, enganos doces. Era tão bom fingir paixões imperecíveis! Podia lembrar das misturas musculares e mucosas. Céus! As coisas não iam nada bem. Como podia pensar nos corpos quentes de outrora de uma maneira tão fria? Toda a comunhão de carnes foi embora, de uma vez por todas, nos dias em que sua alma esteve fundida à de uma certa pessoa. Aquele que era como luz, que aparecia sempre nos fins de tarde e revelava as cores do mundo, mas sempre sumia com a chegada do sol. Um dia entardeceu, anoiteceu, e não houve clarão, mas uma luz fraquinha, como de uma lanterna com bateria fraca; ele não apareceu, apenas ligou e disse: "Oi! Como vai?". E eu, que andava tão precisada da sua presença, como todos os dias, ganhei apenas um cumprimento qualquer que costumamos dar à uma pessoa que não é cara pra nós. Depois, nas noites seguintes, a luz, minha luz, se foi por completo. Talvez esse seja o preço da conta de luz que devo pagar por ter enganado tanto. Agora era o momento de fechar as janelas e parar de tentar ver alguma cor com as luzes vizinhas, ficar sozinha com suas insignificâncias.
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