-Por que você diz não? Você sabe que a felicidade é efêmera, poderíamos sim ter um momento de felicidade como antes.
(Pra você é fácil. Quem largou tudo foi você. Foi você quem tinha uma vida paralela, toda bem organizada, esperando que decidisse o que era melhor. A morte, querido, ficou comigo. Sabe aquela história de dizermos que morreríamos sem a presença do outro? Quanto imaturidade, não é mesmo mesmo? Pois eu morri de verdade. Você não sabe o que é ter o passado cheio de cacos no chão, pedaços quebrados de lembranças, e mesmo assim, se arrastar pra ele como quem busca a última gota de água. Você não sabe o que é ver alguém se afastar correndo, levando embora todos os seus melhores planos. Não imagina o que é flutuar no presente, como se não existisse de verdade, porque seu conteúdo já se foi. E sem passado, sem presente ou futuro, o que fica de alguém? Mais uma vez eu digo, é a morte, querido. Eu morri como quem morre de fome. Você imagina como seja? Não se morre de uma vez, com o derradeiro ponto final. Morre-se aos poucos. Primeiro o corpo degrada todas as reservas energéticas possíveis até ó fim. Quando não restar mais nada, o organismo realiza sua última manobra: devora a si mesmo, acabando, enfim com a fome. Mas aí não existe mais vida para comemorar. Você não sabe o que é ter medo de si próprio e não poder ficar sozinho nunca. Mas eu sei. Ainda que passe uma vida inteira, eu vou lembrar. Porque eu te amo. Irremediavelmente, talvez.)
-É, quem sabe.
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